domingo, 20 de setembro de 2009

A MÚSICA DE PROTESTO DURANTE A DITADURA

Geraldo Vandre durante apresentação no Festival Internacional da Canção - Maracanazinho - 1968

Chico Buarque de Holanda



Professor Melander

A MPB de protesto surgiu como continuidade e, ao mesmo tempo, negação da bossa nova, movimento alienado da classe média da zona sul do Rio de Janeiro na década de l950, misto de samba e jazz, que se opunha à “ditadura do samba negro” dos morros cariocas, cujos temas eram a beleza da mulher, o mar, o ócio diletante, etc.
Sofreu influência ideológica dos dramaturgos do “Teatro de Arena” e dos “Centros Popular de Cultura” de inspiração comunista, dentro da estética proposta por Jdanov em 1948 (realismo socialista, clareza, simplicidade, tonalismo) e interpretação histórica baseada em Werneck Sodré, sobre a necessidade da revolução democrático-burguesa nacional para atingir a etapa capitalista antes da socialista (etapismo, reformismo).
A temática central mais comum era a do “dia que virá” e o discurso era dirigido ao favelado e ao sertanejo retirante. Os recursos musicais se baseavam no sistema tonal, nos acordes dissonantes de nona maior e nos ritmos sincopados regionais brasileiros.
Caracterizava-se pelo nacionalismo cultural e pelo anti-imperialismo americano.
Em termos práticos, poética e musicalmente, assumiram várias formas: ou de extrema simplicidade (ex: Caminhando = rima pobre, música consonante) ou de complexidade (ex: Sabiá e Ponteio = lírica sofisticada, música com acordes em nona com notável influência dos clássicos [Debussy]).
A música era incrementada de instrumentos regionais (viola, berimbau, etc.) e, quando não, havia a imitação sonora e seqüencial dos mesmos.
Estabeleceram-se, assim, as oposições: samba X jazz; música de raízes X música americana; compositor militante X compositor alienado; música de arte X música consumo; dissonância X consonância musical; viola caipira X guitarra; MPB X jovem guarda, tropicalismo, etc.
As origens históricas desse movimento remontam 1962, quando houve a cisão do PCB e do PC do B, em conseqüência da questão chinesa (rompimento de relações entre a China de Mao e a URSS). Após 1966, com o “racha do Comitê Central do Partidão (PCB), várias organizações surgiram, sendo que a maioria delas optou pela luta armada (a hora é agora). Surgiram assim várias correntes musicais que representavam ideologicamente esses mesmos grupos. É o que aconteceu no Festival da Record de 1967, quando muitas dessas correntes foram contempladas com prêmios.
Em 1968, porém, os acontecimentos transbordaram com a ofensiva do Tet no Vietnã, os estudantes nas ruas em Paris, a Primavera de Praga, os protestos anti-guerra nos EUA, a movimentação estudantil em São Paulo e Rio de Janeiro e a guerrilha em plena atividade.
Nesse contexto, durante as eliminatórias do Festival Internacional da Canção (Globo), os compositores “alienados” foram desclassificados logo de início por pressão “popular”, indicando a radicalização ideológica do momento.
No entanto, na final brasileira, ganhou “Sabiá” de Chico Buarque de Holanda e Tom Jobim, que era uma canção de exílio considerada “reacionária”, contra “Caminhando” de Geraldo Vandré, que era uma crítica ao pacifismo hippie das flores e um rompimento com o conceito do “ dia que virá” (quem sabe faz a hora, não espera acontecer).
Tanto Chico como Vandré sofreram ameaças por parte da ditadura. Vandré, entretanto, assumiu uma postura militante de enfrentamento em suas músicas. Chico, ao contrário, optou pelo “dia que virá” e não pela “a hora é agora”, conforme trecho de Sabiá: “vou voltar, sei que ainda vou voltar, para o meu lugar”.

FONTES:

MELANDER FILHO, Eduardo. A Música de Protesto Durante a Ditadura. Gazeta de Interlagos, São Paulo, 11 set 2009 a 24 set 2009. História, p. 2.

MELANDER FILHO, Eduardo. A Música de Protesto Durante a Ditadura. Gazeta de Interlagos, São Paulo, 11 set 2009 a 24 set 2009. Edição 139, p. 2. Disponível em: http://www.gazetadeinterlagos.com.br. Acesso em: 18 set 2009.

ACESSO ÀS MÚSICAS E VÍDEOS CORRESPONDENTES DAS MÚSICAS RELACIONADAS NESSE ARTIGO:

- O Ponteio de Edu Lobo e Capinam, com Marilia Medalha e Edu Lobo – 1967
http://www.youtube.com/watch?v=GWPmnVjIC5E

- Caminhando ou Prá não dizer que não falei das flores de e com Geraldo Vandré – 1968
http://www.youtube.com/watch?v=PDWuwh6edkY

- Sabiá de Chico Buarque de Holanda e Tom Jobim com Cynara e Cybele – 1968
http://www.youtube.com/watch?v=U9epAdaRXCk&feature=PlayList&p=F60D3DA7F43A4640&playnext=1&playnext_from=PL&index=24

FONTES COMPLEMENTARES DE ARTIGOS ANTERIORES:

MELANDER FILHO, Eduardo. São Paulo: um resumo histórico-social. Gazeta de Interlagos, São Paulo, 28 ago 2009 a 10 set 2009. Edição 138, p. 2. Disponível em: http://www.gazetadeinterlagos.com.br . Acesso em: 18 set 2009.

MELANDER FILHO, Eduardo. O “Se” na História. Gazeta de Interlagos, São Paulo, 14 ago 2009 a 27 ago 2009. Edição 137, p. 2. Disponível em: http://www.gazetadeinterlagos.com.br . Acesso em: 18 set 2009.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

SÃO PAULO: UM RESUMO HISTÓRICO-SOCIAL

Velejar na represa do Guarapiranga em cheia: uma das opções de lazer da cidade de São Paulo.


Professor Melander

A cidade de São Paulo foi fundada em 1554 pelos Jesuítas, junto a uma aldeia Tupi. Seu primeiro nome foi o de “São Paulo de Piratininga”, que em tupinambá quer dizer: peixe seco.
No transcorrer dos séculos XXVI, XXVII e XXVIII, serviu como residência e base de abastecimento dos bandeirantes, que adentravam no interior do continente em terras espanholas em busca de riquezas e a fim de escravizar os índios. Esses aventureiros falavam a língua geral brasileira, que era uma espécie de tupi antigo, e também o espanhol. A maioria mal sabia pronunciar algumas palavras em português.
Até a primeira metade do século XIX, São Paulo era uma cidade pequena, menor do que algumas cidades do interior paulista, como Campinas. A partir da segunda metade do século XIX, com a expansão do café e a construção de vias férreas para escoamento da produção, a cidade tornou-se um centro de entroncamento ferroviário, comércio e abastecimento, crescendo em conseqüência disso.
A imigração estrangeira e a libertação dos escravos fizeram com que São Paulo também tivesse seu crescimento populacional incrementado. Os italianos, em particular, se deslocaram para a cidade no final do século XIX e começo do XX, fugindo das duras condições de trabalho nas fazendas do interior e para onde haviam se dirigido quando chegaram ao Brasil.
Mas foi somente com Getúlio Vargas, a partir de 1932, que São Paulo entrou em vertiginoso crescimento industrial, devido às políticas de incentivo daquele presidente. A partir daí, nunca mais deixou de crescer.
Nova grande migração aconteceu na segunda metade do século XX, agora de nordestinos em geral, forneceu mão de obra não qualificada barata para a construção civil e também para determinados setores da indústria.
Hoje, São Paulo é uma das maiores cidades do mundo em termos populacionais. A região considerada “grande São Paulo”, que abarca os municípios circunvizinhos, possui mais de 15.000.000 de habitantes, perdendo na América Latina apenas para a cidade do México, que é a maior do mundo.
Obviamente que uma megalópole dessas proporções tem também grandes problemas a serem resolvidos, muitas vezes gerados pelo seu próprio gigantismo. Bairros ricos convivem com favelas, lado a lado. Grandes fortunas individuais coexistem com uma grande massa de desempregados e sem teto, desprovida de serviços públicos como saneamento, eletricidade regular, asfalto, hospitais, postos de saúde e escolas suficientes. Há todo um processo de marginalização da periferia da cidade, fazendo com que as pessoas, principalmente os jovens, não cultivem perspectivas para o futuro, permanecendo numa constante baixo-estima pessoal. A violência decorrente é fruto dessas contradições, assim como também da falta de ética e humanidade, muitas vezes agravada por forte desvio de personalidade individual.
Paralelamente, oportunidades únicas para a melhoria das condições de vida e de crescimento do horizonte mental se apresentam. A cidade possui os melhores hospitais, escolas, universidades, vida cultural e opções de lazer do país, além de oferecer muitas perspectivas de realização profissional.
São Paulo é uma cidade que oferece o que há de melhor no mundo, mas também o que há de pior.

FONTE:

MELANDER FILHO, Eduardo. São Paulo: Um resumo Histórico-social. Gazeta de Interlagos, São Paulo, 28 ago 2009 a 10 set 2009. História, p. 2.

O "SE" NA HISTÓRIA

Universidade de São Paulo: Campus da capital


Professor Melander

Foi Platão quem primeiro professou a ideia, conforme os ideais socráticos, de que vencer a sabedoria pela ignorância e a essência pela aparência, utilizando uma retórica comprometida como “ganhar uma discussão a qualquer custo”, é sofisma, diminutivo pejorativo de “sophoi” (sabedoria), em oposição aos propósitos vinculados à busca incessante da verdade.
Os sofistas, dessa maneira, estariam mais propensos primeiramente à persuasão e por último à verdade. Em última análise, os sofismas ou falácias são tapeações bem montadas e destinadas a consecuções de práticas demagógicas.
Aristóteles, posteriormente, montou um esquema de prevenção, onde desenvolveu uma classificação tipológica dos sofismas conhecidos na época. Nela ele descreveu treze falácias ou argumentos falaciosos, dentre as quais o “contrafáccio” ou “hipótese contrária ao fato”, que é um argumento do tipo “se Judas não tivesse traído, Jesus teria sido crucificado?”.
Quando pensamos em História, pensamos imediatamente no passado, em fatos que aconteceram. Pensar, pois, em possibilidades outras de acontecimentos que poderiam surgir como alternativa contestatória aos fatos reais, seria no mínimo de temeridade certa, pois a matéria prima do historiador é a dos acontecimentos do passado e não dos possíveis acontecimentos que nunca se realizaram.
Para um historiador positivista, que pensa numa História descritiva e não interpretativa, a simples ideia da possibilidade de existir acontecimentos históricos não registrados em documentos deve ser considerada heresia.
Já para um historiador que pensa numa explicação teológica da História, o contrafáccio seria aceitável, pois, segundo ele, a História não seria mais do que uma ilustração dos desígnios divinos, uma alegoria em que os homens seriam apenas atores de Deus, que provariam através dos acontecimentos a pequenez humana e a Sua grandeza perante a trama formada por Ele mesmo. Aos que professam essa História baseada num “didatismo moral divino” é necessário se mostrar a todo o momento a ideia do contrário. Deus luta constantemente contra as forças opostas: as dos príncipes angelicais traidores. São eles mandados por “Lúcifer” ou “Mefistófeles dos gregos”, que “dá ordens a setenta e oito príncipes, que comandam seiscentas e sessenta e seis Legiões formadas cada uma delas por seis mil, seiscentos e sessenta e seis anjos caídos ou demoníacos”. A possibilidade de acontecimentos paliativos ou alternativos está a todo momento em colocação disponível, mesmo que, inexoravelmente, Ele, com seus vaticínios deíficos, sempre Se impôs, Se impõe e Se imporá perante a História, pois Ele era, é e será.
A princípio, os maiores adversários da hipótese contrária ao fato deveriam ser os historiadores marxistas, pois acreditamos que a História é uma ciência cujas experiências não se realizam em laboratório, mas sim nos próprios acontecimentos passados (a História é seu próprio laboratório). Assim, o processo histórico é definido como objeto de estudo, onde o coletivo se sobrepõe ao individual, a infra-estrutura à superestrutura, o econômico à sociedade. As realizações efetivas e concretas, portanto, seriam os parâmetros de uma análise marxista da História, o que implicaria numa noção analítica aplicável sobre os “acontecimentos reais” e não sobre os “hipotéticos”. Apesar disso, alguns historiadores marxistas, como é o nosso caso, consideramos aceitável a utilização do contrafáccio enquanto “indagação”, como algo presente na própria elaboração construtiva das ciências, mas não enquanto “imposição metodológica”.

FONTE:

MELANDER FILHO, Eduardo. O “Se” na História. Gazeta de Interlagos, São Paulo, 14 ago 2009 a 27 ago 2009. História, p. 2.